terça-feira, 8 de novembro de 2011

Conselhos do cantor China para as bandas iniciantes

Pedro Escobar/Divulgacao
Em entrevista ao site Divirta-se o ex-vocalista do Sheik Tosado e agora VJ da MTV o pernambucano China fala sobre a vida de um artista independente, reclama dos medalhões que usam incentivos públicos e dá conselhos a jovens músicos. Entrevista recomendadíssima à galera que está começando seu trabalho no mundo da música.




DIVIRTA-SE - Você disse recentemente no Twitter que o novo espetáculo de Vítor Araújo, Angústia, havia mudado o seu conceito de música. Qual é o seu conceito atual e que outros artistas contribuíram para essa sua visão?
CHINA - É sempre bom estar aberto para aprender com outros músicos. Esse novo espetáculo de Vitor Araújo me fez abrir os olhos para outra estética nos shows. É teatro, é música, é tudo junto. Sempre fui fã do que Miele e Boscoli fizeram com o jeito de se apresentar a música para as massas, mas nunca tinha vistoisso ao vivo. Vi agora no espetáculo de Vitor, que é muito bem dirigido por Lírio Ferreira. Não tenho um conceito específico para a música, estou sempre aprendendo e me modificando. Gosto das mudanças. Metamorfose ambulante.

D - Você sempre manteve uma postura bastante crítica ao modus operandi dos coletivos que integram o Fora do Eixo, se posicionando contra artistas e bandas tocarem sem receber cachê. Ao mesmo tempo, o Fora do Eixo diz que esse esquema dá visibilidade para os grupos iniciantes e podem resultar em turnês pagas.
CHINA - Eu não sou contra as bandas que tocam de graça, até porque gosto de várias bandas que tocam nesse circuito. Mas cada artista sabe o que quer da sua carreira. Eu mesmo já fiz muitos shows gratuitos na minha vida, mas acho que tem que saber quando e onde tocar de graça. Se valer a pena, por que não? O que eu questiono no Fora do Eixo é o seguinte: Se é um orgão que recebe dinheiro público para as suas atividades, porque os músicos não estão sendo remunerados? Eu não vejo o nome de nenhuma banda ligada ao Fora do Eixo ficar maior do que a própria entidade, se é que podemos chamar de entidade. Eu só vejo o nome do Fora do eixo aparecer mais do que as bandas. Nesse esquema deles, a banda sempre fica em segundo plano...tanto no pagamento dos cachês como na divulgação do próprio artista. E mais, vale a pena tocar de graça numa cidadezinha do interior de não sei onde, numa quarta feira às 23h? Show de graça só vale a pena se tiver na platéia um monte de gente, formadores de opinião, e outros contratantes de shows. Toquei de graça no primeiro Abril pro rock, e saí de lá com contrato assinado por gravadora, um empresário, e destaque em todos os jornais do país. Saca a diferença? Tu acha que algum cara de gravadora ou algum formador de opinião vai aparecer num show de uma cidadezinha longe pra cacete, numa quarta feira, só pra ver tua banda? Não é assim que as coisas acontecem. Até porque as gravadoras quebraram...e sinceramente, não vejo vantagem nenhuma pertencer a uma gravadora hoje em dia. O melhor é cuidar do seu próprio trabalho e se valorizar. Tem que abrir o olho pros espertalhões do dinheiro público, senão você está sendo apenas usado para que outra pessoa ganhe em cima de você. Posso te contar milhares de bandas que se decepcionaram com esse esquema e estão saindo fora, mas não vale a pena ficar falando das bandas, pois como eu já disse, cada um faz o que quer da sua carreira. Só acho que esse lance do Fora do Eixo é muito papo furado, onde quem se beneficia são os curadores desse negócio e não as bandas. Quem você acha que tá bancando a casa Fora do eixo em São Paulo? as bandas? o circuito que eles fazem pelo país? Não!!! Quem banca essa festinha é o dinheiro público...mas se a matéria-prima de todo festival de música são as bandas, porque elas não estão recebendo por isso? E não sou contra o Fora do Eixo, pelo contrário, acho a idéia de ter uma rede de festivais pelo país sensacional, o que eu questiono é o modus operandi da coisa. O Fora do Eixo não está fazendo nada que uma banda independente não possa fazer sozinha. Na verdade, o Fora do Eixo é o atravessador da coisa. E sempre que tem atravessador na parada, pode ter certeza de que algum ele tá levando...e se esse algum for pouco, você não levará nada. Então é bom abrir o olho.

D - Qual estratégia você recomendaria para uma banda iniciante e independente?
CHINA - As dicas que eu posso dar a uma banda iniciante são: 1- se valorize e acredite no seu trabalho. 2- toque de graça quando valer a pena para a sua carreira (como uma troca), mas não faça disso uma constante. É importante cobrar cachês, pois eles pagam despesas de turnê e outras coisas. E só vale a pena tocar de graça quando o retorno (visibilidade em jornais, revistas, formadores de opinião, contratantes de show) for bom para o seu trabalho. 3- tenha um bom site e sempre atualize o seu conteúdo. 4- Vá pessoalmente (faço isso até hoje) às rádios, jornais, escritórios de vendedores de show e apresente seu material. 5- Todos os contatos de casas de show pelo país estão na internet. Entre em contato com elas, envie seu material de trabalho. 6- Esteja sempre em contato com outros músicos, pois a troca de experiências é importante.

D - Li uma entrevista da Trip em que você diz que“você tem o incentivo e depois tem que se virar, andar com seus próprios pés". Você acha possível viver somente de música, financiando seus próprios álbuns, e todo o resto, apenas com shows?
CHINA - Eu vivo assim até hoje e pago todas as minhas contas em dia. O Simulacro teve o incentivo do Funcultura. Era muita cara de pau ir lá me inscrever para pegar essa grana de novo, né? Já fui incentivado, e depois me virei com meus próprios recursos. Sempre vivi da minha música e estou muito feliz em saber que posso arcar com as despesas de um disco fazendo shows e outras atividades artísticas. Não estou dizendo que as bandas não devem usar esse incentivo...devem sim, pois o governo também precisa cuidar da cultura do país, mas acho que todos, governo e artista tem que ter um "semancol", né? Se já foi incentivado, se vira e faz tua carreira andar, pois existe um monte de artistas que precisam dessa grana também. Você não acha um absurdo eu ter bancado o meu disco do próprio bolso, enquanto artistas consagrados usam a muleta das leis de incentivo para bancar os seus projetos? Se eu, que não sou nenhuma celebridade da música, consegui, por que os artistas consagrados não bancam suas obras também?

D - Você procurou empresas privadas para patrocinar Moto contínuo?
CHINA - Não procurei empresas para bancar meu disco e isso foi um erro meu. Devia ter ido atrás. Aqui em SP, um amigo meu conseguiu grana de uma loja de ar-condicionado para bancar o disco dele...e sem nenhum incentivo fiscal. Agora que eu estou com o disco na rua, algumas empresas estão querendo fazer parcerias e estou negociando com elas. Mas acho que as leis de incentivo devem ser melhoradas. Precisa haver mais fiscalização...não só no dinheiro empregado, mas também na parte artística da coisa, até para os fundos de cultura saberem o que você está fazendo com aquela ajuda que eles deram. Onde está tocando a sua música, em que jornais você foi destaque...esse tipo de coisa. Como você investe em algo e não procura saber que retorno esse trabalho pode lhe dar? É por essas e outras que aparecem sempre os espertalhões da cultura. Gente que fica apenas sugando o dinheiro público e não se movimenta para que o seu trabalho aconteça. É muito cômodo isso. Parece até que o governo virou gravadora, e as coisas não são por aí.

D - Você começou a trabalhar na MTV esse ano e virou uma “novidade” pelo Sudeste/Sul do país, apesar de já ter seu trabalho bem conhecido há mais de uma década aqui no Nordeste. Como é a sensação de ser novamente uma novidade?
CHINA - A crítica do Sul e Sudeste sempre esteve ligada no meu trabalho. Sempre obtive boas matérias sobre meus discos e shows. Na verdade, sinto que sou novidade para uma galera que nem sabia que eu cantava. Tem muita gente que assiste o MTV na Brasa e não sabia que eu sou cantor, que tenho uma carreira de 13 anos. E por causa do programa e de toda a visibilidade que eu estou tendo, essas pessoas procuram sobre a minha vida e esbarram na minha música. Tem sido bem legal ver a reação das pessoas. E o público nos meus shows só aumenta, pois eles se interessam também pela minha música. Estou bem feliz com isso.

D - As músicas de Moto contínuo são bastante diferentes entre si, tanto na sonoridade, quanto na temática. Você também usou músicos diferentes em cada faixa. Por que essa escolha? Qual a “liga” que une as músicas de Moto Contínuo em um álbum?
CHINA - Eu me fiz essa pergunta por um bom tempo: qual a liga do disco? Quando o trabalho ficou pronto, saquei que a grande liga do disco é exatamente essa diferença entre as faixas. Por isso tem tanta gente diferente participando do disco, e por isso decidi mixar o disco com cinco caras diferentes, para dar um tratamento diferente mesmo em cada música. Como artista solo, tenho a liberdade de trabalhar com quem eu quiser, e resolvi explorar isso a fundo. Acho que a grande sacada do disco é essa...são várias formas diferentes de fazer a minha música.

D - Algumas músicas do novo álbum, como Mais um sucesso pra ninguém e Anti herói, mostram letras mais trabalhadas, que de certa forma se aproximam mais da “nova MPB” do que outras, como Só serve para dançar. Você tem se dedicado mais na composição das letras?
CHINA - Eu gosto mais de fazer letra do que música. Sempre fui mais das letras, vide tudo o que eu fiz com o Mombojó, Dado Villa Lobos, e outros artistas que eu fiz parcerias. Sempre mexi mais com as palavras. Todo dia eu escrevo algo, nunca estou parado...minha mãe disse que se eu quisesse ser músico mesmo, teria que ser o melhor. Sei que ainda não consegui isso, mas me esforço um monte para estar entre os melhores. Acho que a idade também ajuda, né? você fica mais esperto em outras coisas, e é natural que a escrita fique mais aguçada. Já acumulo uma biblioteca bacana em casa e leio tudo o que posso. Na hora de fazer uma letra sobre algum tema estudo ao máximo. Procuro livros sobre o assunto e vou me familiarizando mais e mais com o tema...daí a inspiração ajuda a ligar tudo o que eu tô pensando e estudando. E acho que você deveria ouvir Só serve pra dançar mais uma vez. Ela fala exatamente desse momento que a música brasileira vive. Se as rádios não tocam a sua música, se as pessoas nãocompram mais os discos, pra que serve a música então? Pra dançar!!! é uma crítica as mudanças de paradigma que a indústria fonográfica brasileira vive nesse momento. Mais um sucesso pra ninguém tratar do mesmo tema.

D - Você falou que depois de Simulacro já sentiu vontade de gravar outro disco. Sentiu a mesma coisa com Moto Contínuo? Se fosse fazer outro álbum agora, como ele seria?
CHINA - Já tô compondo para um disco novo. Não quero demorar tanto tempo pra lançar outro trabalho. Estou com 15 músicas, que foram as sobras do Moto contínuo, e pretendo usar elas num próximo trabalho. Mas tenho pensado tanta coisa para o novo disco, que é melhor nem comentar, pois amanhã posso tá pensando tudo diferente. Por enquanto estou curtindo a repercussão do Moto contínuo e pretendo fazer muitos shows com esse disco. Depois vem o outro...é natural o processo. Agora estou mais seguro como produtor também e acho que sou capaz de fazer outro álbum interessante.

D - Você passou a fazer entrevistas para MTV. Qual pergunta que você gostaria que fizessem para você e nunca fizeram?
CHINA - Olha, vou dizer que você me perguntou muitas coisas que ninguém tinha perguntado ainda, mas, no momento acho que gostaria de responder a seguinte pergunta: Qual o recado que você daria para os pais de um músico iniciante? e eu respondo: Acredite no talento dele e incentive o garoto. Você pode ter em casa um grande nome da música brasileira e não sabe. Afinal de contas, ninguém nasce Chico Buarque, e até o próprio teve que ralar muito para conseguir crescer artisticamente na carreira.

FONTE: Divirta-se

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